Para mim, esta matéria tem um grande mérito de sair do óbvio embate entre a mídia tradicional e a internet, e tratar da grande (e única?) vantagem dos trabalhos independentes: a própria independência. Independência de tema, independência de tamanho, independência de traço, independência de prazo, independência de constância.
Veja a última tira do Renan Lima, por exemplo: pura putaria! Acho que jamais seria publicada no Estadão ou na Folha. Ou então a minha série dos idiotas. Se fosse em algum jornal, provavelmente eu receberia este telefonema do editor:
- Alô, eu poderia falar com o Andrício?
- É ele. Quem gostaria?
- Andrício, aqui é o (nome do editor), tudo bem?
- Tudo, rapaz! E contigo? A que devo tamanha honra?
- Tudo bem, também. É o seguinte. Eu gostei muito, mas muito mesmo da sua nova série de tira, a dos idiotas.
- Puxa, que bom! Fico muito contente por isso.
- Mas você poderia encerrá-la o quanto antes? Não se trata de uma questão qualitativa, muito pelo contrário! Mas alguns leitores estão se sentindo desgostosos com a... Como pode dizer? Com a pungência das tiras!
- Com a pungência?
- É.
- E se eu tirar a pungência, posso continuar?
- Não é isso. Estou com saudades das tirinhas que você faz sobre sua mãe. Você pode fazer uma para amanhã?
- Mas é claro!
- Ótimo, Andrício. Ótimo! No resto, está tudo bem com você e seus gatos?
- Tudo sim, na semana passada chegou uma gata nova aqui, a Rubi. Você tem que ver como ela...
- Desculpa, Andrício, vou ter que desligar agora, que acabou de chegar o presidente da empresa. Grande abraço e fique com Deus!
- Outro!
E assim eu faria a tira sobre a minha mãe. De repente poderia sair uma boa tira. Isto não é nem um problema. Se a pessoa quiser fazer um trabalho totalmente autoral, basta que faça um blog, ou um livro. Mas para aparecer no jornal dos outros, e ser pago por isso, é preciso se adaptar um pouco.
Um pena mesmo é que existam poucas revistas de quadrinhos, onde, aí sim, poderíamos ter trabalhos mais experimentais e menos diluídos - para usar a palavra da entrevista.
6 comentários:
Os quadrinistas (amadores como eu e profissionais) deveriam unir-se e fundar algum tipo de revista com o apanhado de tiras de todos. Seria legal pra caramba, o problema seria somente o lance autoral.
Boas dicas. Muito obrigado.
Bicho, mesmo que um dia seja necessário dar a b* para sobreviver, coisa que todos nós fazemos diariamente, basta preservar tua identidade - e se possível este espaço.
Valeu pela citação, Andrício. Grande abraço.
Sou tão lerdo que nem reparei no meu nomezinho ali. Valeu irmão!
Acho que o meio termo é o melhor (ou o que se deveria pretender). Laerte, por exemplo, que está no mainstream com um pensamento totalmente offstream. E ele não é o único. Acho que o grande barato é saber usar as armas que você possui, dentro do ambiente em que você está. O desafio para mim não é manter a integridade autoral num meio "visado" como jornais ou revistas ou televisão, mas sim CHEGAR LÁ. Estando lá, você pode se virar e falar tudo que quiser, tomando o cuidado para não ser antidiplomático; não é "prostituir seu pensamento", mas falar as coisas incômodas da maneira certa, sem ficar pulando chamando a atenção de maneira besta ou sem sutileza.
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